20 anos de Constituição: o novo Ministério Público Brasileiro e suas perspectivas no Estado Democrático de Direito (1)

Carlos Roberto de C. Jatahy (2)

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Breves considerações sobre o Estado Democrático de Direito. 3. A instituição do Estado moderno e suas transformações: do Absolutismo até o Estado Democrático de Direito. 4. O Ministério Público Brasileiro e o Estado Democrático de Direito. Novas funções para um velho conhecido: o agente de transformação social 5. Perspectivas e desafios para o século XXI. Propostas para aperfeiçoar a atuação do Ministério Público Brasileiro. 6. Conclusão.

1. INTRODUÇÃO

A sociedade brasileira comemorou, em outubro de 2008, os vinte anos de sua “Constituição-Cidadã” (como ULYSSES GUIMARÃES denominou a nova ordem, no momento solene da promulgação), que após longo período de regime autoritário, instituiu, em “terrae brasilis”, o Estado Democrático de Direito (3).
O presente trabalho, fruto de reflexão acerca de lapso temporal tão marcante, tem por objetivos: a) analisar os aspectos formais da mudança de paradigma constitucional na essência do Estado Brasileiro, com ênfase nos aspectos históricos relevantes para a instauração do regime democrático; b) ressaltar o perfil que foi reservado ao Ministério Público no novo contexto político-jurídico instituído; e c) apontar alguns desafios que serão enfrentados pela Instituição nos novos tempos que se avizinham, apresentando propostas para o aperfeiçoamento do Parquet, face a experiência adquirida nestas duas décadas de nova identidade.

2. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

A configuração do Estado Democrático de Direito não decorre apenas da união formal dos conceitos de Estado Democrático e Estado de Direito. Na verdade, o conceito é novo e deve-se levar em conta outro componente a ser adicionado àqueles já existentes: as conquistas democráticas; as garantias jurídico-legais e a preocupação social, tudo constituindo um novo conjunto, em que o objetivo primordial será a transformação social, ou “a transformação do status quo” (4).
Com efeito, como observado por MANUEL GARCIA-PELAYO (5), o Estado de Direito “significa, assim, uma limitação do poder do Estado pelo Direito, porém não a possibilidade de legitimar qualquer critério concedendo-lhe a forma de lei”. É indispensável que seu conteúdo reflita um determinado ideário, uma nova perspectiva de esperança social e não apenas um Estado marcado sob uma ótica formal de direito, não apenas “um Estado legal” (6).

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(1) Artigo publicado em: Temas Atuais do Ministério Público. A Atuação do Parquet nos 20 Anos da Constituição Federal. 2ª edição. Editora Lumen Juris, 2010.
(2) Carlos Roberto de Castro Jatahy é Procurador de Justiça do MPRJ, Mestre em Direito Público, Professor Universitário da FGV – Direito Rio e da FEMPERJ (Fundação Escola do Ministério Público do RJ). Ex-examinador de Princípios Institucionais em concursos do Ministério Público e autor dos livros Curso de Princípios Institucionais do Ministério Público (4ª edição, 2009. Rio de Janeiro: Lumen Juris); O Ministério Público no Estado Democrático de Direito (2007. Rio de Janeiro: Lumen Juris), e Ministério Público: Legislação Institucional (5ª edição, 2010. Rio de Janeiro: Roma Victor), foi coordenador da Comissão encarregada de elaborar a Lei Orgânica do Ministério Público Fluminense (LC 106/2003) e Conselheiro do Conselho Superior do Ministério Público (biênios 2005/2007 e 2007/2009). É, desde janeiro de 2009, Subprocurador-Geral de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.
(3) Art. 1.º, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito…”
(4) Lenio Luiz Streck e José Luiz Bolzan de Moraes. Ciência política e Teoria Geral do Estado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 92.
(5) Manuel Garcia-Pelayo. Las transformaciones Del Estado Contemporâneo. Madrid: Allianza. 1982, p. 52.
(6) Lenio Luiz Streck e José Luiz Bolzan de Moraes, op. cit., p. 93.