Associativismo e sindicalismo judiciários
(Nótula de Apresentação de um Livro)

Manuel da Costa Andrade
Professor Catedrático da Faculdade de Direito
da Universidade de Coimbra

1. Num gesto de incomensurável generosidade, quis o Senhor Dr. JOÃO PALMA, Presidente do Sindicato do Ministério Público, dar-me o privilégio de ocupar esta tribuna como apresentador do Livro Associativismo e Sindicalismo Judiciários. Uma Realidade Incontornável na Democracia Moderna.
O convite que nesse sentido me foi dirigido configura naturalmente uma grande honra, além do mais por me cometer uma tarefa de irrecusável responsabilidade. O que talvez se possa dizer é que a aceitação da minha parte só pode ser levada à conta de irremível irresponsabilidade. E isto porquanto, como pude certificar-me no primeiro instante de reflexão que se seguiu à declaração imprudente de aceitação, me faltam manifestamente as credenciais indispensáveis para o cumprimento da tarefa, ao menos segundo limiares mínimos de dignidade. Se bem vejo as coisas, o apresentador de um livro só pode ser um conhecedor — no limiar superior da exigência e da excelência — da área problemática versada no mesmo livro. Isto é, tem de conhecer e dominar a matéria ao nível dos grandes modelos e dos princípios basilares e fundantes. E estar, como tal, capacitado para formular e apresentar compreensões arquetípicas sobre o tema, para depois as erigir em referentes de valoração e de escrutínio crítico da obra a apresentar. E, a partir daí, fazer chegar aos destinatários da apresentação a sua mensagem sobre os créditos da obra. Mensagem que naturalmente leva consigo um estímulo ou desafio, mais ou menos aberto, mais ou menos subtil, à sua leitura. Ou, reversamente, a prevenção contra o desperdício desse gesto.
Seria por demais ocioso protestar que não é, seguramente, esse o meu caso, quando está sobre a mesa um livro sobre associativismo/sindicalismo, de mais a mais sobre associativismo/sindicalismo judiciários.
Desde logo, não sou um estudioso dos problemas sindicais, nem sequer ao nível dos problemas jurídicos, não dominando as leges artis do seu tratamento dogmático. Menos ainda sou detentor de construções teóricas sustentadas sobre os dados que dominam a experiência sindical. Não domino nem sequer tenho uma perspectiva correcta sobre os seus problemas, maxime sobre as linhas de afrontamento e conflito que lhes estão subjacentes. Menos ainda sobre os horizontes de convergência ou, ao menos, de superação normativa. E é assim tanto do lado dos paradigmas de enquadramento normativo (constitucional, legal ou convencional); como do lado da experiência daqueles cujos trabalhos e os dias são fundamentalmente consumidos em tarefas de reivindicação e de negociação quando não nas trincheiras dos combates abertos e expostos para que são, com maior ou menos frequência, mobilizados. Em definitivo, não tenho por mim nem a teoria nem a prática das coisas de que fala o livro e sobre as quais se espera que eu discorra.
As carências sobem exponencialmente de tom — nessa mesma medida e proporção subindo as dificuldades e a complexidade — quando se faz intervir a especificação e a qualificação judiciário. A minha experiência e os meus contactos com os magistrados estão fundamentalmente circunscritos aos respectivos estatutos e regimes jurídicos, oferecidos pelas leis, nomeadamente as leis processuais-penais. É, por causa disso, um conhecimento preferencialmente centrado sobre as funções, os estatutos (espectro de competências, de direitos, deveres e comandos jurídicos ou mesmo deontológicos) e os papeis que lhes estão cometidos no drama judiciário. É um conhecimento abstracto e descarnado, distanciado das mulheres e homens concretos e reais que subjectivizam os papeis, se escondem e vivem por baixo das […]