Critérios judiciais de convolação não homogénea pelo artigo 16º do Regime Processual Civil Experimental

Rui Pinto
Professor Auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

SUMÁRIO: § 1º Enquadramento. 1. O Regime Processual Civil Experimental. 2. O art. 16º do Regime Processual Civil Experimental: enunciado e problema. § 2º Posição preliminar.1. Doutrina. 2. Convolação não homogénea da providência cautelar em acção principal. – A. Objecto e condições; – B. Não condições; – C. Procedimento. 3. Conclusões. Problema por resolver: critérios judiciais de convolação do objecto da causa. § 3º Objecto cautelar e objecto final. 1. Qualificação da convolação do art. 16º RCE como forma de tutela antecipatóra. 2. O objecto antecipado; conclusões. 3. O objecto cautelar. – A. Algumas notas doutrinais; – B. Posição pessoal; – C. Inidentidade com o objecto final; – D. O paradoxal aproveitamento do objecto cautelar. § 4º Retorno ao art. 16º RPCE. 1. Critérios de convolação do art. 16º RPCE. – A. Convolação da causa de pedir; – B. Convolação do pedido antecipatório; – C. Convolação do pedido de segurança. § 5º Conclusões.

§ 1º Enquadramento

1. O Regime Processual Civil Experimental.

I. O Decreto-Lei nº 108/2006, de 8 de Junho, criou o chamado Regime Processual Civil Experimental (RPCE)(1). O decreto-lei é aplicável a acções declarativas cíveis a que não corresponda processo especial e a acções especiais para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos.
A “natureza experimental” traduziu-se em este regime começar a vigorar apenas nas comarcas determinadas na Portaria nº 955/2006, de 13 de Setembro (cf. ainda o art. 21º nº1 RPCE): juízos de Competência Especializada Cível do Tribunal da Comarca de Almada, Juízos Cíveis do Tribunal da Comarca do Porto, Juízos de Pequena Instância Cível do Tribunal da Comarca do Porto, Juízos de Competência Especializada Cível do Tribunal da Comarca do Seixal(2).
Esses tribunais foram escolhidos de entre os que apresentavam elevada movimentação processual, atendendo aos objectos de acção predominantes(3) e actividades económicas dos litigantes (cf. nº 2 do mesmo art. 21º)(4) e às “diferentes amplitudes de competência dos tribunais, aferidas em função da sua competência cível específica e da existência de tribunais de competência especializada na circunscrição em causa”(5).

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(1) Sobre o Regime Processual Experimental há vária bibliografia especializada: MARIANA FRANÇA GOUVEIA, Regime Processual Experimental. Anotado – Decreto Lei n.º 108/2006, de 8 de Junho, Coimbra, Almedina, 2006; LUÍS BRITES LAMEIRAS, Comentário ao Regime Processual Experimental, Coimbra, Almedina, 2007; LUÍS CARVALHO RICARDO, Regime Processual Civil Experimental. Anotado e Comentado, Braga, CEJUR, 2007; Regime Processual Civil Experimental. Simplificação e Gestão Processual (coord. RITA BRITO), Braga, CEJUR, 2008; PAULO RAMOS DE FARIA, Regime Processual Civil Experimental. A gestão processual no processo declarativo comum experimental, Braga, CEJUR, 2009.
(2) Entretanto, em 2009, a Portaria nº 1244/2009 ensaiou um alargamento aos Juízos de Competência Especializada Cível do Tribunal da Comarca do Barreiro, de Competência Especializada Cível do Tribuna da Comarca de Matosinhos e àsVaras Cíveis do Tribunal da Comarca do Porto. Esse alargamento, e apenas esse alargamento, a vigorar a 4 de Janeiro de 2010, foi porém suspenso pela Portaria n.º 1460-B/2009, de 31 de Dezembro, ”dado o objecto e a amplitude da matéria a ser apreciada pela comissão de processo civil”.
(3) Concretizando, lê-se no preâmbulo da dita Portaria que “os objectos de acção predominantes nos tribunais escolhidos reflectem a caracterização nacional: em primeiro lugar estão as acções que têm por objecto actos, contratos e outras obrigações; em segundo, e raramente com grande diferença, as que têm por objecto o cumprimento de contrato e outras obrigações, sobretudo uma dívida civil ou comercial.
(4) Novamente, lê-se no preâmbulo da dita Portaria que, no que à “actividade económica dos litigantes — em especial, a dos autores — respeita, em todos estes tribunais prevalece o sector de comércio por grosso e a retalho, seguido dos sectores de transportes, armazenagem e comunicações, de actividades financeiras e de actividades imobiliárias, aluguer e serviços prestados às empresas. Pela “acuidade que esta descrição apresenta nos foros situados nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, centros urbanos onde se concentra a maior parte da litigância cível”, teve-se ainda em consideração a localização geográfica dos tribunais.
(5) Ainda no mesmo Preâmbulo.