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N.º 12, 17 de Fevereiro
Poucas são as novidades políticas; e está tudo em expectativa: esperam-se reformas, melhoramentos, etc.
As comissões vão como podem, trabalhando com actividades, para apresentarem os pareceres sobre as propostas do governo.
Ontem o governo teve em casa do senhor ministro do reino uma longa reunião, o que leva a crer que se trata de prontamente elaborar as reformas que hão-de ser apresentadas sobre a supressão de alguns distritos e sobre a instituição e criação da guarda civil.
De resto, são estas as poucas e magras novidades que lhes posso contar.
Agora percorro os jornais; vejo isto: queixas, declamações, acusações vagas. Todos pressentem que estamos numa crise, que não foi criada por estes ou por aqueles, mas trazida pela fatalidade das coisas.
E esta crise, que os fados fizeram, poderão cortá-la os homens? Na política as instituições colaboram mais que as individualidades. Do sistema das instituições, do seu resultado prático, da sua influência moral, podem vir certos factos de prosperidade ou certas manifestações de decadência de que os homens não têm culpa; não são os ministros, nem os reis, nem os cardeais que a preparam, é a lei social.
Hoje que tanto se fala em crise, quem não vê que, por toda a Europa, uma crise financeira está minando as nacionalidades? É disso que há-de vir a dissolução. Quando os meios faltarem e um dia perderem as fortunas nacionais, o regímen estabelecido cairá para deixar o campo livre ao novo mundo económico.
Esta crise que Portugal sente na sua fortuna, sente-a igualmente a Espanha, a Itália, a Áustria, etc.
O que virá, não se sabe; que há-de vir alguma coisa, é verdade; se a felicidade social, se apenas o elemento de uma nova dissolução, se a grandeza e a justiça, se o desalento e a decadência, isso quem o sabe?
Nós cá andamos a cem léguas destas coisas. Estamos longe de movimentos políticos da Europa, longe do grande jogo diplomático das nacionalidades, compondo e recompondo pacientemente os nossos ministérios. Nós não nos ocupamos do futuro, como uma criança que sabe que estão velando por ela. E com efeito alguém vela por nós.
Eu tenho esta tendência para me deixar ir a falar da política da Europa, porque a julgo a mais verdadeiramente interessante para nós outros portugueses. Ainda que longe do movimento político, não estamos longe das transformações; e qualquer desequilíbrio no estado actual, era para nós uma crise terrível de nacionalidade, porque íamos cair numa ou noutra boca. O imperador disse há pouco que em breve iria abandonar a política de conquista e de invasão.
No entanto, quando tudo se desfizer, se agitar, nós seremos sacudidos, embalados, e talvez se veja que a política de invasão e de conquista não está tão abandonada como se diz.
Esse é que é o dia terrível, esse é que devemos temer.
Até então parecem-nos injustas aquelas acusações terríveis contra certos homens políticos, contra os ministérios. Porque se acusam? Têm eles porventura culpa das decadências? Eu não quero considerar as decadências como imperscrutáveis determinações da Providência. Não. Mas sendo como são resultados dos factos, dos costumes, da índole da época, dos maus sistemas da constituição, da corrupção, não podem estes homens ou aqueles ser culpados, seja qual for a sua inércia, seja qual for a sua acção; sejam da política da esquerda, sejam da política da direita, de qualquer ideia ou unha que sejam.
Podem sim desperdiçar mais ou menos, poupar algumas migalhas, reformar as suas secretarias, isso não acelera a decadência como não salva da ruína.
Eu não digo que não haja uma culpa em não tomar uma iniciativa poderosa, em não acalentar a ideia de que, crescida e desenvolvida, se há-de tornar facto. Mas isso pertence mais aos homens da opinião, do […]
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(1) Artigo publicado em: Temas Atuais do Ministério Público. A Atuação do Parquet nos 20 Anos da Constituição Federal. 2ª edição. Editora Lumen Juris, 2010.
(2) Carlos Roberto de Castro Jatahy é Procurador de Justiça do MPRJ, Mestre em Direito Público, Professor Universitário da FGV – Direito Rio e da FEMPERJ (Fundação Escola do Ministério Público do RJ). Ex-examinador de Princípios Institucionais em concursos do Ministério Público e autor dos livros Curso de Princípios Institucionais do Ministério Público (4ª edição, 2009. Rio de Janeiro: Lumen Juris); O Ministério Público no Estado Democrático de Direito (2007. Rio de Janeiro: Lumen Juris), e Ministério Público: Legislação Institucional (5ª edição, 2010. Rio de Janeiro: Roma Victor), foi coordenador da Comissão encarregada de elaborar a Lei Orgânica do Ministério Público Fluminense (LC 106/2003) e Conselheiro do Conselho Superior do Ministério Público (biênios 2005/2007 e 2007/2009). É, desde janeiro de 2009, Subprocurador-Geral de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.
(3) Art. 1.º, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito…”
(4) Lenio Luiz Streck e José Luiz Bolzan de Moraes. Ciência política e Teoria Geral do Estado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 92.
(5) Manuel Garcia-Pelayo. Las transformaciones Del Estado Contemporâneo. Madrid: Allianza. 1982, p. 52.
(6) Lenio Luiz Streck e José Luiz Bolzan de Moraes, op. cit., p. 93.