Page 156 - Revista do Ministério Público Nº 156
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O acesso a dados de tráfego pelos Serviços de Informações à luz do direito fundamental à inviolabilidade das comunicações António Manuel Abrantes
garantia da inviolabilidade das comunicações, reconduzindo-o ine- quivocamente ao domínio do processo criminal[3].
Partindo desta posição de base, o Tribunal sustentou então que o regime de acesso aos dados de tráfego previsto na norma fiscalizada só seria compatível com o direito fundamental à inviolabilidade das telecomunicações, consagrado no n.o 4 do artigo 34.o da Constituição, se o mesmo se inserisse integralmente no âmbito da exceção prevista na parte final dessa norma, sendo concebido como uma medida restritiva aplicada“em matéria de pro- cesso criminal”. Na sequência desta apreciação, o Tribunal chegou a uma resposta negativa, assente em três razões essenciais.
Em primeiro lugar, o Tribunal recordou que a atividade pre- ventiva de recolha de informações levada a cabo pelos Serviços de Informações se distinguia com clareza das medidas de investigação criminal que têm lugar no decurso de um processo penal, uma vez que a interceção das comunicações por parte destes serviços não iria ocorrer no âmbito de um processo penal dirigido à investigação de um crime já ocorrido, mas sim no âmbito de um procedimento administrativo dirigido a investigações genéricas de natureza preventiva[4]. Ou seja, enquanto o processo penal se inicia com a notícia de um crime já praticado e a recolha de informações que ocorre no seu decurso dirige-se à investigação desse facto concreto e em relação a sujeitos específicos tidos como suspeitos, este procedimento admi- nistrativo preventivo iria possuir um âmbito muito mais vasto, pois nem se iria encontrar objetivamente delimitado por um facto concreto ocorrido no passado, nem subjetivamente delimitado por referência a uma, ou várias, pessoas concretas que fossem suspei- tas da sua prática. Assim, ao contrário do que acontece na ativi- dade de investigação criminal processualizada e publicizada que é
[3] Cfr. Acórdão n.o 403/2015, cit, par. [4] Cfr. Acórdão n.o 403/2015, cit, par. 16-18. 19.