Page 158 - Revista do Ministério Público Nº 156
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O acesso a dados de tráfego pelos Serviços de Informações à luz do direito fundamental à inviolabilidade das comunicações António Manuel Abrantes
Por último, o Tribunal considerou ainda que este procedi- mento administrativo não oferecia sequer garantias análogas às que existem no processo penal para a ingerência nas comunicações pri- vadas, pois o regime previsto não continha densidade suficiente para assegurar a salvaguarda dos direitos fundamentais dos visados pela interceção das comunicações em moldes semelhantes ao regime previsto para o mesmo efeito no direito processual penal, reme- tendo para a esfera administrativa ponderações que deveriam cons- tar da lei[6]. Segundo o Tribunal, esta indeterminação verificava-se em cinco domínios essenciais do regime de acesso aos dados de tráfego: nos pressupostos de acesso, nas condições de acesso, no procedimento de acesso, na duração do acesso e no tratamento e eliminação dos dados recolhidos. Em primeiro lugar, foi sustentado que os pressupostos de acesso não se encontravam definidos de forma suficientemente precisa, na medida em que a possibilidade de ingerência não se iria limitar à prevenção dos crimes taxativamente fixados no Decreto mas também à prevenção de quaisquer outros “atos que, pela sua natureza, possam alterar ou destruir o Estado de Direito democrático constitucionalmente estabelecido”, o que se revelava perigoso, pois a elasticidade desta expressão poderia ser aproveitada para um acesso incondicionado aos dados de tráfego. Em segundo lugar, foi também entendido que as condições de acesso a estes dados não se encontravam legalmente determinadas de forma suficientemente densa, em dois diferentes domínios: por um lado, os critérios para aferir a necessidade em cada caso concreto da interceção das comunicações eram bastante vagos e não repre- sentavam mais do que um redundante afloramento do princípio da proporcionalidade da atuação administrativa, pois era apenas imposto que os dados recolhidos fossem “necessários, adequados e
[6] Cfr. Acórdão n.o 403/2015, cit, par. 21-23.































































































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