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Revista do Ministério Público 156 : Outubro : Dezembro 2018
Conselheira, a posição seguida pela maioria pareceu ter assen- tado no pressuposto de que a relação existente entre um direito fundamental e uma autorização constitucional expressa para a sua restrição consiste numa relação fechada entre uma regra e uma exceção, na qual a regra seria o direito fundamental em causa e a exceção seria os casos em que a restrição pode ocor- rer. Se assim fosse, seria efetivamente inequívoco que o n.o 4 do artigo 34.o da Constituição apenas admitiria restrições ao direito fundamental à inviolabilidade das comunicações em matéria de processo penal e em mais nenhuma, não sendo pois possível, à luz desta formulação, admitir interceções de telecomunicações realizadas fora do âmbito de um processo penal em curso. Acon- tece que, no seu entender, não é esta a interpretação que deve ser dada à solução consagrada no n.o 2 do artigo 18.o da Constituição, quando estabelece que “[a] lei só pode restringir os direitos, liberda- des e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição”. Com efeito, na sua perspetiva, quando as normas constitucionais autorizam expressamente restrições a determinados direitos fun- damentais, as mesmas não estão a criar relações de regra/exceção, mas sim simplesmente a antecipar a possibilidade de uma ocor- rência futura de conflitos entre esse direito e outros interesses constitucionalmente protegidos, devolvendo ao legislador ordi- nário a tarefa de os solucionar. Seria também este o papel desem- penhado pela autorização constitucional de restrição do direito fundamental à inviolabilidade das comunicações prevista no n.o 4 do artigo 34.o da Constituição, tendo o legislador constitucional simplesmente previsto a possibilidade de uma ocorrência futura entre dois interesses contrapostos constitucionalmente tutela- dos: por um lado, a inviolabilidade das comunicações e a liber- dade das pessoas; e, por outro lado, a necessidade de preservação de valores comunitários fundamentais, os quais são tutelados por leis penais aplicadas no contexto de um processo penal.