Page 162 - Revista do Ministério Público Nº 156
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O acesso a dados de tráfego pelos Serviços de Informações à luz do direito fundamental à inviolabilidade das comunicações António Manuel Abrantes
Partindo desta posição de base, a Juíza Conselheira argumen- tou então que deveria ser reconhecido que existe uma inegável afinidade valorativa ou teleológica entre as finalidades prosseguidas pelos Serviços de Informações e as finalidades prosseguidas no âmbito do processo penal, uma vez que a existência destes serviços se justifica precisamente para salvaguardar bens jurídicos constitu- cionais que possuem uma importância semelhante face aos bens que são tutelados por normas penais incriminadoras[9]. Assim, fundando-se nesta relação de proximidade e no facto de a ameaça à liberdade individual que decorre desta atividade preventiva ser menor do que a que decorre da aplicação das normas do processo penal, sustentou que a autorização constitucional para restringir a inviolabilidade das telecomunicações “em matéria de processo criminal” se poderia também estender, por maioria de razão, à atividade pre- ventiva exercida pelos Serviços de Informações.
Enquadrada a norma restritiva no âmbito da autorização cons- titucional prevista no n.o 4 do artigo 34.o da Constituição, a Juíza Conselheira concluiu então que a questão central no juízo de apre- ciação de constitucionalidade residiria unicamente em apurar se essa restrição cumpria, ou não, os restantes pressupostos previstos no artigo 18.o da Constituição para a restrição de direitos, liberda- des e garantias[10]. E foi precisamente neste ponto que concordou com a posição seguida pela maioria relativamente à falta de den- sidade normativa do regime previsto no decreto fiscalizado para a interceção de dados de tráfego das telecomunicações, o que, no seu entender, fazia com que a restrição ao direito fundamental à invio- labilidade das comunicações não cumprisse dois dos pressupostos consagrados no n.o 2 do artigo 18.o da Constituição: por um lado, não respeitava a exigência da reserva de lei material, pois a norma
[9] Cfr. Acórdão n.o 403/2015, cit., [10] Cfr. Acórdão n.o 403/2015, cit., “Declaração de voto”, par. 4. “Declaração de voto”, par. 5-6.






























































































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