Page 170 - Revista do Ministério Público Nº 156
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O acesso a dados de tráfego pelos Serviços de Informações à luz do direito fundamental à inviolabilidade das comunicações António Manuel Abrantes
dados de tráfego previsto no Decreto n.o 426/XII não continha densidade suficiente para assegurar a salvaguarda dos direitos fun- damentais dos visados pela interceção das comunicações, o que fazia com que o procedimento de acesso a este tipo de dados não oferecesse sequer garantias análogas às que existem no processo penal para o mesmo efeito. Na nossa leitura, os cinco domínios previamente identificados como problemáticos pelo Tribunal Constitucional foram objeto de francas melhorias na nova versão apresentada pelo legislador e deixaram de merecer censura cons- titucional. Em primeiro lugar, os pressupostos de acesso aos dados de tráfego encontram-se agora definidos de forma clara e precisa, uma vez que o mesmo passou a ser possível apenas para prevenir duas categorias específicas de crimes taxativamente fixadas neste diploma - a espionagem e o terrorismo (artigo 4.o e n.o 2 do artigo 10.o)[16]. Em segundo lugar, também as condições de acesso passaram a ser legalmente determinadas de forma substancialmente mais densa, nas duas vertentes que tinham sido objeto de censura cons- titucional: 1) por um lado, os critérios para aferir a necessidade, em cada caso concreto, do acesso aos dados são agora mais espe- cíficos, pois o n.o 1 do artigo 6.o passou a dispor que o pedido de acesso só pode ser autorizado quando houver razões para crer que a diligência é necessária, adequada e proporcional “para a obtenção de informação sobre um alvo ou um intermediário determinado” (alínea a)), ou “para a obtenção de informação que seria muito difí- cil ou impossível de obter de outra forma ou em tempo útil para responder a situação de urgência” (alínea b)); 2) por outro lado, o círculo de destinatários abrangidos encontra-se agora delimitado
[16] Assim, para além da exclusão de outras categorias de crimes que se encontravam contidas no Decreto n.o 426/XII (a sabotagem, a proliferação de armas de destruição maciça e a cri- minalidade altamente organizada de
natureza transnacional), relativamente aos quais apenas passou a ser possível o acesso a dados de base e de localização de equipamento (artigo 3.o), o legislador eliminou a polémica expressão “atos que, pela sua natureza, possam alterar
ou destruir o Estado de Direito demo- crático constitucionalmente estabele- cido”, a qual tinha sido expressamente censurada pelo Tribunal Constitu- cional no Acórdão n.o 403/2015 (vide supra, parte I, ponto 3 deste artigo).





























































































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