Page 24 - Revista do Ministério Público Nº 156
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Ressocializar, hoje? Entre o «mito» e a realidade André Lamas Leite
constitucional[61]. Com a decisão n.o 313 de 1990, é assinalada uma revi- ravolta em tal entendimento, porquanto a Corte Costituzionale aban- dona a retribuição como finalidade autónoma da pena, em detrimento de desideratos preventivos, relevando a primeira somente em função da proporcionalidade entre gravidade do facto e da sanção. A ressocia- lização é vista como uma forma de evitar que a prevenção transforme o condenado em um instrumento ao serviço de fins que lhe não são inerentes. Em relação à expressão que sublinhámos no preceito consti- tucional, com este aresto de 1990 passa a entender-se que a reinserção integra o próprio sentido ontológico da pena, sublinhando o Tribunal que ela vale tanto para o legislador como para o juiz, e bem assim, para a administração penitenciária, no que se pode definir, dizemo-lo, como uma omnipresença da finalidade reeducativa ao longo de todas as fases do sistema jurídico-criminal[62]. Emilio Dolcini[63] não tem dúvidas em afirmar que se deve estar grato ao legislador pela sua expressa pre- visão, tendo o princípio como um dos esteios de um Estado de Direito republicano e como um «termo fundamental de referência para o futuro desenvolvimento da legislação penal»[64].
III. Conceito operatório de «ressocialização»
1. Enquadrados na periodização histórica possível, onde também já se foram adiantando algumas das posições que subscrevemos, é agora tempo para reflectir sobre um conceito operatório do que
[61] Giovanni Fiandaca, «Scopi della pena tra comminazione edittale e commisurazione giudiziale», in: Giu- liano Vassalli (dir.), Diritto penale e giurisprudenza costituzionale, pp. 131 e 134.
[62] Giovanni Fiandaca, «Scopi della pena...», pp. 136-138.
[63] «Rieducazione del condannato e rischi di involuzioni neoretributive: ovvero, della lungimiranza del costi- tuente», in: Rassegna Penitenziaria e Criminologica, II-III (2005), p. 81.
[64] Para uma panorâmica do até aqui explanado, Paolo Stella, «The pur- pose and effects of punishment», in: EJCCLCJ, 9, 1 (2001), pp. 65-68.