Page 26 - Revista do Ministério Público Nº 156
P. 26
[ 31 ]
Ressocializar, hoje? Entre o «mito» e a realidade André Lamas Leite
criminosos as condições — em meio prisional ou fora dele — para os mesmos, querendo, voltarem a ser cidadãos socialmente integra- dos e cumpridores das prescrições legais. Mais ainda, a ressociali- zação assume um carácter «social», com o que visa sublinhar-se a ideia de que se não trata apenas de uma tarefa do condenado, mas de uma interacção deste com a comunidade[67].
Na Alemanha, logo em finais do séc. XIX, era comum a ideia de que os juízes, no que concerne às penas curtas de prisão, deve- riam procurar substitutivos (em especial, a pena de multa) sempre que a culpa pelo facto fosse diminuta[68]. Na actualidade, apesar de o Bundesverfassungsgericht (BVerfG: Tribunal Constitucional Federal alemão) afirmar que o problema dos fins das penas é uma questão dogmática e sobre a qual não tem de pronunciar-se[69], con- siderando que existe um largo espaço de conformação do legislador infraconstitucional[70], certo é que, como Roxin pôs em destaque, de vários pronunciamentos se pode retirar que essa jurisprudên- cia acaba por tomar posição em sentido que anda próximo do que faz vencimento na doutrina maioritária daquele país. Assim, nos quadros das ditas «teorias da união», o Tribunal de Karlsruhe acaba por entender que as finalidades preventivas são as que relevam em maior medida, já que, quando se refere à retribuição, fá-lo
[67] Assim, José Cid Moliné, ¿Pena justa o pena útil? (El debate contem- poráneo en la doctrina penal española), Madrid: Ministerio de Justicia, 1994, p. 243.
[68] Paul Felix Aschrott, Ersatz kurzzeitiger Freiheitsstrafen. Eine kri- minalpolitische Studie, Hamburg: Verlagsanstalt und Druckerei Uctien- -Geselschaft, 1889, pp. 6-7. Como se sabe, na feliz expressão de Priit Pikamäe/Jaan Sootak, «Einheit der verfassungsmässigen Rechtsord-
nung: Entscheidungen und Lösungen im Strafrecht», in: JuInt, VII (2002), p. 130, ainda hoje o sistema assenta em um «triângulo prisão — multa — alternativas às penas principais.».
[69] Entre tantos, Claus Roxin, «60 Jahre Grundgesetz aus der Sicht des Strafrecht», in: Peter Häberle (Hrsg.), 60 Jahre deutsches Grundgesetz, Tübingen: Mohr Siebeck, 2011, p. 67. Ao invés, como é natural, do BGH. Entre tantos acórdãos, cf. BGHSt 24, 40, onde claramente se aponta que a
pena não é uma simples retribuição pela culpa do crime, mas que só é legí- tima como instrumento preventivo.
[70] «La teoría del fin de la pena en la jurisprudencia del Tribunal Constitu- cional alemán», in: Santiago Mir Puig/Joan Josep Queralt Jiménez (dirs.), Constitución y principios del derecho penal: Algunas bases constitucio- nales, Valencia: Tirant lo Blanch, 2010, pp. 234-235.