Page 37 - Revista do Ministério Público Nº 156
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Revista do Ministério Público 156 : Outubro : Dezembro 2018
[97] Na lapidar expressão da BVerfGE 109, 133, pp. 134, ss., «o respeito e a pro- tecção da dignidade humana configu- ram princípios constitucionais da Lei Fundamental», mais se afirmando que tal impede, de todo, que o ser humano seja transformado em meio para atingir um fim, o que, ab initio, obsta a qual- quer seu tratamento cruel ou degra- dante ou, acrescentamos nós, violador do princípio da proporcionalidade.
[98] Para uma distinção entre os con- ceitos, veja-se Anabela da Costa Leão, Constituição e interculturalidade: da diferença à referência, disserta- ção de doutoramento apresentada à Faculdade de Direito da Universi- dade Nova de Lisboa, 2013, pp. 137, ss. e 257, ss. Com interesse, de igual modo, Luísa Neto, Novos direitos ou novo(s) objecto(s) para o Direito?, Porto: U.Porto Editorial, 2010, pp. 187-210.
constitucional a uma obrigação ou dever jurídico de ressocializa- ção, mas sim um direito subjectivo. Pode bem suceder que o agente deseje viver contra o dever-ser jurídico-penal, sem que possamos forçá-lo à fidelidade ao Direito, não somente porque tal contra- riaria a eminente dignidade da pessoa[97], mas visto que, na prática, tal não funcionaria. Embora não seja isso que o ordenamento pre- tenda, teremos de aceitar que alguém escolha para si uma vida em constante contradição com o Direito Penal, ponto é que este seja capaz de responder a esses inputs por via dos outputs das reacções criminais. Não parece ser outro, logo em 1971, o sentido de uma das conclusões do VII Congresso Internacional de Defesa Social (Paris), ao perguntar-se se seria lícito os Estados pretenderem a ressocialização em sociedades cada vez mais multiculturais, pro- blematizadas, com fundas crises de valores, dizendo-se que se devia respeitar o sistema axiológico do condenado, oferecendo-lhe meca- nismos aptos, todavia, ao exercício da sua liberdade na comunidade. Esta questão convoca intricados problemas de multiculturalismo, interculturalismo e sua influência no Direito Penal, nomeada- mente por via da chamada cláusula de cultural defence[98]. As espe- cíficas questões de Direito Penal que o tema convoca, em especial a aplicabilidade ou não — e em que termos — do artigo 17.o[99].
Em extrema síntese, subscrevemos a Real[100], segundo o qual a tolerância é
conclusão de Miguel fruto de uma sociedade
[99] Podem compulsar-se em Frede- rico de Lacerda da Costa Pinto et al. (orgs.), Multiculturalismo e Direito Penal, Coimbra: Almedina, 2014.
[100] Nova teoria do mal, 2.a ed., Alfra- gide: Publicações D. Quixote, 2012, pp. 174-177.


























































































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