Page 8 - Revista do Ministério Público Nº 156
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Ressocializar, hoje? Entre o «mito» e a realidade André Lamas Leite
a que se seguiria uma fase crísica até cerca dos anos Noventa, mo- mento a partir do qual se assistiria a algum retorno. As duas pri- meiras fases podem ser traduzidas, em súmula, por Therapien statt Strafe («terapia em vez de pena»)[12].
Antecipa-se já que, com a crise do Welfare State, em meados da década de 1960, o ideal ressocializador entrou em severa crise, em especial nos Estados do Norte da Europa, que mais longe o levaram.
Algumas das razões que militaram a favor dessa desilusão encontram-se na força que foram ganhando as teorias interaccionis- tas e marxistas, a par da perda de confiança no modelo de tratamento como controlo criminal, bem como uma perspectiva segundo a qual reabilitar era sempre uma intervenção perturbadora nas liberdades do condenado, que assim era instrumentalizado por algo que não deixava de ser ainda uma parte do aparelho do Estado. Do prisma político, o New Right no Reino Unido e nos EUA, com Thatcher e Reagan, defendia um sistema penal mais severo[13].
Como bem sublinham Worrall/Hoy[14], a discussão acabou por ficar prejudicada por se ter tratado em plano de igualdade a «reabilitação carcerária» (a que deve ser alcançada, quando pos- sível, durante e por efeito do cumprimento de uma pena privativa de liberdade) e a «reabilitação não-institucional», ou seja, aquela
[12] Heinz Eyrich, «Gedanken zur Bewährungs- und Straffälligenhilfe in Europa», in: Heinz Eyrich/ Walter Odersky/Franz Jürgen Säcker (Hrsg.), FS für Kurt Reb- mann zum 65. Geburtstag, München: Beck, 1989, p. 187, em especial no que diz respeito aos toxicodependentes, sendo o autor claro ao afirmar que, em finais da década de 1980, a Alemanha se encontrava, neste domínio, em linha com os demais países europeus. Em termos gerais, também em países como a França, não somente no tocante a este último segmento de delinquentes,
autores como Paul Ricoeur (O justo ou a essência da justiça, Lisboa: Insti- tuto Piaget, 1997, pp. 175-178 e 182-- 183) propendiam para uma verdadeira «ética da pena», capaz de significar a noção do «justo», em um sentido que julgamos duplo: por um lado, um interesse acrescido pela vítima e pelos seus direitos e, por outro, a atribuição de uma componente «moral» à sanção (este último aspecto já criticável), na senda de um reforço da «auto-estima» do condenado, a que não seriam alheias considerações gerais-preventivas, con- siderando o autor a comunidade como
«veículo», «amplificador» e «porta-voz do desejo de vingança». Acresce a isto o que Ricoeur designa por «econo- mia do dom», que separa claramente de uma vertente jurídica e entrega, em exclusivo, à vítima — «o perdão dá um futuro à memória».
[13] Anne Worrall/Clare Hoy, Punishment in the community. Mana- ging offenders, making choices, 2nd ed., Devon: Willan Publishing, 2005, p. 24.
[14] Punishment in the community..., p.27.
























































































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