Page 66 - Revista do Ministério Público nº 86
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Revista: No 86 - 2o trimestre de 2001
Capítulo: Ofensas à Procuradoria-Geral da República - Inquérito e acusação pelo Ministério Público - Constitucionalidade
Título: Acórdão No 581/2000 do Tribunal Constitucional
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Página: 115
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Ofensa à Procuradoria-Geral da República - Inquérito e acusação pelo Ministério Público - êú
Constitucionalidade
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Acrdo No 581/2000 do Tribunal Constitucional (*) ç
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Acordam na 1a Secção do Tribunal Constitucional: ãçã
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1. Na sequncia de queixa apresentada pelo Procurador-Geral da República, o Ministério Público deduziu í
acusao contra Diogo Pinto de Freitas do Amaral, Professor universitário, imputando-lhe a prática, em êú
autoria material , de um crime de ofensa a pessoa colectiva , previsto e punível pelas disposições
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conjugadas do artigo 187o e artigo 183o do Código Penal.
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No requerimento em que pediu a abertura de instrução , o Professor Diogo Freitas do Amaral invocou a íõçã
ilegitimidade ou incompetncia do Ministério Público para o exercício da acção penal, por estar em causa ã
no processo, nos termos da queixa apresentada, "não só a pessoa do Procurador-Geral da República, çá
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como tambm a prpria Procuradoria-Geral e o Ministério Público“, e suscitou a questão da éã
inconstitucionalidade das normas do artigo 263o , No 1, e artigo 264o , No 1, do Código de Processo Penal, çãí
"que atribuem competncia ao Ministrio Público para dirigir e realizar o inquérito e deduzir acusação, [por ãóã
incompatibilidade] com os princpios do Estado de Direito, da legalidade e da imparcialidade consagrados çç
no artigo 2o e artigo 219o da Constituio na sua versão actual, sempre que os ofendidos sejam aquele ãáõ
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rgo do Estado, a Procuradoria-Geral da República ou o seu presidente“.
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Na deciso instrutria, proferida em 25 de Março de 1998 (fls. 242 e seguintes), a Juíza do Tribunal de
Instruo Criminal de Lisboa considerou improcedente a invocada ilegitimidade ou incompetência do ó
Ministrio Pblico e afastou a inconstitucionalidade suscitada, nestes termos:
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"O requerente no invoca [...] a interpretao que faz das normas e princípios para alcançar tal conclusão.
E teria sido til que o tivesse feito, porque o que o arguido pretende é, e salvo o devido respeito, que é ú
muito, uma interpretao desconforme com o princpio da legalidade, com os princípios do Estado de
Direito e com a prpria Ordem Constitucional, o que com simplicidade se demonstra. A tese do arguido ãá
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conduziria ab absurdo a situaes, como a de quem ofendesse os tribunais em geral, não admitisse ser íã
julgado por nenhum deles, a pretexto de inconstitucionalidade fundada em falta de isenção de todos os é
Tribunais, j que todos fariam parte da mesma estrutura, como a de que o Tribunal Constitucional não teria
legitimidade ou iseno para apreciar os diplomas emanados da Assembleia da República, da qual o
prprio Tribunal emana por eleio. No basta, pois, que se aleguem meras suspeições abstractas e não ó
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concretizadas.
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O Estado de Direito consagra o princpio da legalidade. Consagra, igualmente, a separação de poderes. çé
Na prpria estrutura do Poder Judicial, est cometida aos Juzes a funão jurisdicional, que, em sentido
material, a actividade do Estado que tem, por fim geral, declarar e aplicar nos casos concretos o Direito e
a Justia e tutelar os direitos e interesses legalmente protegidos, reprimir as infracções da legalidade e íú
dirimir os conflitos de interesses pblicos e privados, atravs de rgos imparciais e independentes, os áç
Tribunais. Ao lado desta funo, surge a do Ministrio Pblico, a quem a Constituição nos termos do artigo ã
219o [...] comete o exerccio da aco penal.
Tambm o disposto no artigo 265o do Cdigo do Processo Penal, ao prever que, se for objecto de notícia à
do crime, Magistrado Judicial ou do Ministrio Pblico, designado para a realização do inquérito
Magistrado de categoria igual ou superior do visado, no ofende o princpio da legalidade, e até visa
tutelar a iseno e imparcialidade das investigaes. Tambm, por esse motivo, se o visado for o
Procurador-Geral da Repblica, e por no haver Magistrado do Ministrio Pblico que lhe seja superior, a
competncia do inqurito pertence a um Juiz. Ora, o artigo 265o do Cdigo do Processo Penal, visando a çõú
iseno e imparcialidade das investigaes, s aplicvel quando os arguidos ou suspeitos sejam á
Magistrados, e, no enfermando de qualquer inconstitucionalidade, no aplicvel s situaes em que a
queixa seja apresentada por um Magistrado contra um cidado comum.
Ora, no pode o requerente pretender que, pelo facto de a queixa ser apresentada pelo Procurador-Geral
da Repblica, as regras do Estado de Direito , consagradas na Constituio da Repblica, sejam ê
subvertidas, e o Ministrio Pblico no possa exercer a aco penal, passando a mesma a ser exercida
pelos Tribunais, a quem competir julgar a final, o que ainda seria mais inconstitucional, e apenas se
justifica na situao do arguido ser Procurador-Geral da Repblica, nos termos e fundamentos j indicados
supra. Pior seria, pois, a soluo pretendida pelo requerente. Acresce, finalmente, que a improcedncia