Intervenção do M.º P.º em representação de instituto público: petição inicial a requerer o cancelamento de registo predial nulo por ter sido lavrado com base em título falso

João Alves

PA ….

O presente PA teve origem em participação remetida pelo Instituto dos Registos e Notariado IP, com vista à instauração de uma acção de nulidade do registo lavrado na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob a apresentação n.º 3 de 17/9/2010, respeitante ao prédio ……/……, fracção W, da freguesia do Estoril, concelho de Cascais.

No âmbito da instrução do PA foram obtidos os seguintes elementos:

– Certidão da requisição n.º 7, integrada pelos seguintes documentos: escritura de compra e venda (falsa), efectuada em 15/9/2010, no Cartório Notarial da Notária Maria ……., caderneta predial urbana, certidão permanente do Registo Comercial relativo à Ré, certidão da Conservatória do Registo Predial de Cascais, relativa à fracção autónoma «W».

– Cópia certificada de fls. 70 a 71 do livro de escrituras n.º 98 do Cartório Notarial da Notária Maria ………..
– Certidão actualizada da fracção autónoma «W».

A primeira questão que se coloca é a de saber se o MP tem legitimidade para intentar tal acção. A questão não é original nesta Procuradoria, no SIMP, sob o n.º 454 encontra-se um despacho datado de 4/5/2000 (cfr., fls. 49 a 54), em que perante um pedido similar da então Direcção-Geral dos Registos e Notariado, a Colega entendeu que o MP não tinha legitimidade, posição que obteve a concordância hierárquica.

Com o devido respeito pela posição defendida, não posso segui-la. É verdade que não se trata de um caso de intervenção oficiosa, em que o MP actua «em nome próprio» na expressão utilizada pelo Regulamento de Custas Processuais.
O âmbito da designada actuação oficiosa do MP (1) é a defesa ou prossecução de um interesse público radicado na própria colectividade, expresso no estatuto do MP (Lei n.º 47/86 de 15/10, art. 3.º, n.º 1, al. l) ao conferir competência ao MP para «Intervir nos processos … e em todos que envolvam interesse público».

Como características deste tipo de intervenção principal saliento:

1 – O carácter oficioso. A intervenção não é condicionada por qualquer entidade pública relacionada com a prossecução do interesse em causa(2).
2 – O carácter taxativo, é reportada a um tipo específico de actuação prevista na norma que atribui competência.
3 – O MP actua como verdadeiro substituto processual dos titulares das relações jurídicas materiais e não como representante destes.

Todavia, o mencionado despacho é omisso quanto à análise da possibilidade de intervenção do MP em representação do Estado (3). Na data, a Direcção-Geral dos Registos e Notariado, entidade responsável pelo registo predial, que se destina «essencialmente a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário» (art. 1.º do Código de Registo Predial), estava […]

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(1) Na expressão utilizada por Matos, Manuel Pereira de, Intervenção do Ministério Público na Jurisdição Civil, Intervenções Oficiosas, CEJ, policopiado, 1996, pág. 1.
(2) Uma excepção encontra-se no art. 1416.º, nº 2 do C.Civil.
(3) Estado no sentido de Estado-Administração, pessoa colectiva de direito público que tem como órgão de administração o Governo (art. 182.º e seg. da Constituição).