Para recomendar a leitura de – A Criança na Justiça Trajectórias e significados do processo judicial de crianças vítimas de abuso sexual intrafamiliar, de Catarina Ribeiro (1)

Rui do Carmo
Procurador da República

1. Foi com o maior gosto que aceitei o convite para apresentar a publicação deste estudo – A Criança na Justiça – Trajectórias e Significados do Processo Judicial de Crianças e Jovens Vítimas de Abuso Sexual Intrafamiliar(2) – desenvolvido pela Drª Catarina Ribeiro(3) no âmbito do Mestrado em Psicologia do Comportamento Desviante – Violência, Crime e Vítimas, da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. Estudo que considerei de grande importância logo que, em 2006, tive a oportunidade de, num congresso em Braga, ouvir a apresentação das suas primeiras conclusões provisórias, não lhe tendo mais perdido o rasto. Confirmei-o quando, no ano de 2008, tive oportunidade de ler a versão final e integral. De grande importância pelo tema e pela qualidade científica com que é tratado, de grande importância também pelo ângulo escolhido para o abordar. Sublinho – de grande importância, também, pela escolha de um ângulo de observação do problema muito pouco habitual.
O objecto do estudo empírico realizado consiste em, “a partir do discurso directo das crianças vítimas de abuso sexual intrafamiliar, aceder aos significados e sentidos que estas conferem à experiência de contacto com o sistema judicial”, “à experiência da criança na integração vivencial das etapas do processo judicial, às dificuldades que sente, às suas emoções e pensamentos, às experiências que cria e aos esforços que entende necessários para superar estas etapas”(4).
A investigação vertida nesta obra incide, mais concretamente, “[n]o que pensa a criança sobre o tribunal, das expectativas que tem sobre a sua participação nos processos (ou da ausência desta), da condução dos processos judiciais, bem como dos significados e sentidos dos mesmos na sua trajectória pessoal, do impacto da interacção com os diferentes intervenientes do processo e dos significados atribuídos às decisões que a envolvem directamente”(5).

Aqui, a voz é dada à criança. É ela a verdadeira protagonista deste estudo.

2. A importância e a actualidade do tema são assinaladas logo nas primeiras páginas do prefácio, da autoria da Professora Celina Manita, que passo a citar:
“O fenómeno da violência contra crianças e, em particular, o abuso sexual têm vindo – muito por força de alguns processos judiciais fortemente mediatizados – a alcançar crescente visibilidade, a ser objecto de debate e problematização social, a suscitar generalizada condenação. O aumen- to do conhecimento sobre as suas dinâmicas e processos, a crescente consciencialização das suas consequências, uma maior atenção aos seus sinais, levam a um aumento do número de denúncias e, por consequência, dos processos judiciais. Desta forma, as crianças tornam-se, cada vez […]