Tempos de condução, de repouso, e pausas no transporte rodoviário

João Soares Ribeiro
Jurista

SUMÁRIO: 1 — Considerações gerais; 2 — Objectivos da transposição da Directiva 2006/22/CE; 3 — Aspectos inovatórios a salientar; 3.1 – A quantificação da actividade fiscalizadora; 3. 2 — O organismo de coordenação e ligação; 3.3 – O critério de imputação da responsabilidade contra-ordenacional; 3.4 – A responsabilidade contra- ordenacional colectiva laboral; 3.5 – Evolução legislativa da responsabilidade social dos entes colectivos nos transportes rodoviários; 3.6 – Repercussões da entrada em vigor do REG 561/2006 e DL 237/2007 3.7 – A responsabilidade contra-ordenacional no art. 13º da Lei n.º 27/2010; 3.8 – As coimas proporcionais; 3.9 – O pagamento da coima.

1 — Considerações gerais

Em 30 de Agosto, em cumprimento da obrigação inscrita no art. 189.º do Tratado de Roma que impõe aos Estados-Membros a transposição das Directivas, foi publicada a Lei n.º 27/2010 que estabelece um novo regime sancionatório por violação das disposições legais sobre tempos de condução, pausas e tempos de repouso por parte dos condutores de viaturas pesadas, seja de mercadorias, seja de passageiros.
Como tal matéria se encontrava, de algum modo, já disciplinada em legislação nacional, concretamente no Dec.-Lei n.º 272/89, de 19/08 (alterado pela Lei n.º 114/99, de 03/08), e em legislação comunitária, o Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março, interessará verificar se, e quais, os aspectos legais que foram alterados, uma vez que as normas do diploma de 1989 foram revogadas e substituídas pelas da lei nova.
Mas interessará muito mais, disso estou certo, atenta a forte querela jurisprudencial existente ao nível dos Tribunais da Relação, clarificar qual de entre os diplomas concorrentes, designadamente o REG/2006, o Dec.- -Lei n.º 237/2007 ou a Lei n.º 27/2010 ora publicada, tem capacidade para se aplicar a cada uma das situações em concreto de violação pelos diversos agentes da disciplina neles contida.
Será de acrescentar que o controlo da instalação e utilização do aparelho que, na maioria dos casos (1), regista aquela actividade dos designados trabalhadores móveis – o tacógrafo (2) – sendo também objecto desta Lei n.º 27/2010 (art. 1º/1/b), é matéria que, contudo, aqui não abordaremos ex professo uma vez que ela consta essencialmente do Dec.-Lei n.º 169/2009, de 31/07, e a competência para a instrução dos processos e aplicação das correspectivas coimas foi deferida ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I. P. (IMTT, I.P.), nos termos do seu art. 6.º/1.
Preliminarmente ainda, não se deverá deixar de referir que a iniciativa legislativa partiu de uma proposta do Governo – a Proposta de Lei n.º 20/ /XI/1.ª (3) — para transposição da Directiva n.º 2006/22/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15/03, entretanto alterada pelas Directivas n.os 2009/4/CE e 2009/5/CE, da Comissão, respectivamente de 23 e 30 de Janeiro.
Relativamente à Directiva de 2006, cujo prazo de transposição, nos termos do seu art. 16.º, findara já em 1 de Abril de 2007, o Estado Português fora mesmo condenado por Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, 6.ª Secção, de 19 de Maio de 2009 – Comissão/Portugal, Proc. C-253-08 (4).

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(*) O texto corresponde, praticamente sem alterações, ao trabalho de doutoramento apresentado, no âmbito do Seminário Geral do Curso de Doutoramento 2009/2010 da FDUC, ao Exmo. Senhor Professor Doutor Luís Miguel Andrade Mesquita. Cabe referir aqui, ainda, que os pontos 2 e 3 do trabalho reproduzem os ensinamentos e a compreensão do princípio da boa fé processual deste mesmo Professor. Foi, indiscutivelmente, a sua aula a razão maior para nos termos dedicado a explorar este tipo de responsabilidade. Aliado o gosto que nascera aos conhecimentos oriundos do trabalho diário como investigadora do Observatório Permanente da Adopção, foi assumindo contornos mais definidos aquilo que entendemos poder designar por responsabilidade processual dos pais por violação do princípio da boa fé nos processos de adopção.
(1) E dizemos na maioria dos casos, porque situações há em que é admissível o registo manual em folhas impressas (art. 3.º, final do n.º 1 da Parte A e início do n.º 3 da Parte B do Anexo).
(2) Cujo regime de instalação e utilização se encontra no Regulamento (CEE) n.º 3821/85, do Conselho, de 20/12.
(3) Publicada no Diário da Assembleia da República, II série A, n.º 75/XI/1, de 2010.05.06.
(4) Também, até à publicação desta Lei 27/2010, não fora transposta a Directiva n.º 2009/ /5/CE, da Comissão, de 30 de Janeiro, — que altera o Anexo da Directiva de 2006 — e de cujo art. 2.º constava, igualmente, a obrigação de transposição até 31 de Dezembro de 2009.