Page 5 - REvista do Ministério Público Nº 81
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aos atentados contra essa mesma autodeterminação.
Se a resposta fosse afirmativa, não estaríamos, todavia, já no âmbito do princípio da territorialidade, mas 
sim num seu alargamento a uma responsabilidade pelo território timorense. Seria uma espécie de 

responsabilidade pela efectivação de um poder punitivo relativamente a certos factos, na medida em que 
tal poder punitivo correspondesse à exigência do direito internacional de garantir a autodeterminação e a áí
independência do território timorense.
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Tal resposta não corresponde, todavia, a uma interpretação aceitável da Constituição, para além de ser éãóíó
impraticável no plano do Direito Internacional. ááç
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Com efeito, o Estado português não tem, fora do exercício da sua soberania ou do cumprimento de ó
acordos internacionais, um poder de intervenção penal, de modo que o princípio da territorialidade não çãã
pode ser interpretado com uma dimensão de mera responsabilidade por um outro território em que não ã
exerce efectivamente poderes soberanos. Já num plano de tutela de bens universais o Estado português çá
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intervm subsidiariamente e desde que os autores dos crimes se encontrem em território português, o que ççêãê
demonstra, igualmente, ainda aí, uma condição de soberania.
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Assim, a lgica dos critérios que determinam a competência internacional do Estado português não conduz êêãáêéç
a qualquer competncia espacial relativamente a Timor que ultrapasse as situações descritas no Código ã
Penal. A interveno penal relativamente a Timor dos tribunais portugueses é, por conseguinte, inaceitável êã

com base no princpio da territorialidade. E tão-pouco seria legítimo, no plano internacional, que um Estado í
se arrogasse, em nome de uma finalidade de contribuir para a autodeterminação de Timor (que, por razões 
histricas, a comunidade internacional reconhece como legítima), a um poder de intervenção penal. A í
posio internacional de Portugal relativamente a Timor existe, em nome dessa missão, mas apenas çãí
postula um dever especfico de colaboração com a comunidade internacional para a consolidação da ãã
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autodeterminao (e, hoje, independência) de um povo.
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3. A anlise da competncia internacional do Estado português terá de ser completada com a referência ao çãéí
chamado princpio da universalidade. Logrará este critério satisfazer suficientemente, dada a natureza dos 
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crimes, as possibilidades de interveno punitiva dos tribunais portugueses em Timor? ê
Na verdade, poder-se-ia pensar que através deste critério teríamos o instrumento adequado a uma 
automtica competncia punitiva do Estado português, no caso de os crimes cometidos poderem ser 
qualificados como crimes contra a paz e humanidade, ou serem integráveis numa outra categoria referida 
pelo artigo 5o.
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Todavia, a condio de punibilidade referida no artigo 5o, No 1, alínea b), exige a presença do agente em ç
territrio portugus, no sendo tambm admissvel, em face do artigo 69o da Lei No 144/1999, de 31 de ã
Agosto, deduzir pedido de extradio para meramente efectivar a presença em território português dessa 
pessoa que cometeu no estrangeiro crime contra a humanidade. O referido preceito exige, com efeito, ç
processo pendente em tribunal portugus, o que pressupõe a anterior comprovação da competência do é

tribunal portugus e, consequentemente, a verificao prvia da própria condição de punibilidade.
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Alis, a justificao desta soluo  um certo entendimento da razão de ser do princípio da universalidade: áó
a cooperao entre os Estados no sentido de se colmatarem lacunas de perseguição penal, por força da 
mobilidade internacional das pessoas. A competncia interventiva dos tribunais portugueses relativamente óã

aos crimes contra a humanidade praticados fora do seu territrio justificar-se-ia por não ser, em regra, ãó
possvel a extradio de nacionais, por haver outros obstculos à extradição de tais agentes ou por a 
extradio no ter sido requerida pelo Estado em cujo territrio o crime se cometeu. Mas a competência 
internacional dos Estados no deveria, neste entendimento, substituir uma ordem internacional penal. ãç
Nenhum Estado poderia representar a comunidade internacional fora de um sistema de cooperação entre ã

Estados. Enfim, nenhum Estado poderia ser juiz do mundo.
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Deste modo, haver que concluir que os tribunais portugueses no so, em princípio, competentes para 
julgar os crimes praticados contra os timorenses. Mesmo quando o fossem teoricamente, com fundamento 
no princpio da universalidade, no o seriam praticamente, pelo facto de os agentes não se encontrarem êê
em territrio portugus.

Segundo este entendimento, no poderia ter sido emitido pelo Direito portugus um pedido de extradição 
de Pinochet como foi possvel em Espanha ( 1 ). Portugal no poderia pedir a extradição de Pinochet
ó
alegando a prtica de crimes contra a humanidade, nem to-pouco o poderia fazer com base no princípio 
da nacionalidade, se invocasse que Pinochet teria cometido crimes contra portugueses [artigo 5o, No 1, 
ç
alnea c)], por tambm ser exigida, de acordo com este critrio de competncia, a presena do agente em 
territrio portugus [artigo 5o, No 1, alnea c) I].
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A figura da extradio activa para efectivar a presena em territrio portugus do agente do crime não 
parece estar prevista no Direito portugus. Na verdade, uma tal soluo poderia permitir,  margem de 
convenes internacionais quanto ao alargamento do poder e da responsabilidade punitiva dos Estados, 

que cada Estado se elegesse representante da comunidade internacional, para alm da estrita 
necessidade, quando o exerccio do poder punitivo de outros Estados, em cujo territrio se encontram os 
agentes, no se tenha pretendido concretizar.














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