Page 76 - Revista do Ministério Público Nº 49
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Revista:
No 49 - 1o trimestre de 1992
Autor:
Pedro Manuel Branquinho Ferreira Dias
(Delegado do Procurador da República)
Capítulo:
áIntervenções Processuais
Título:
Intervenção do Ministério Público em defesa do património cultural
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Pgina:
161
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Intervenção do Ministério Público em defesa do património cultural (*)
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Os presentes autos de processo administrativo tiveram por origem uma noticia publicada no Diário de ãíçéç
Coimbra, de 27/3/1991, intitulada «Em Pereira pratica--se crime contra património histórico-cultural», da ãããã
responsabilidade de Correia Góis. 
Do seu teor constatava-se que para além de alguns considerandos que não vêm ao caso se denunciava 
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que algum no identificado procedia a obras, no centro de Pereira, área desta comarca, num edifício çàã
contguo  Casa-Celeiro dos Duques de Aveiro, destinadas à abertura de um restaurante, com janelas em ãêãá
alumnio, facto este que era susceptível de inviabilizar a possível classificação e adaptação da referida âúç
casa a centro de cultura e museu etnográfico.
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Mais se denunciava ainda que as obras em causa tinham obtido licença da Câmara Municipal desta vila. éçõççã
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Em face desta situao, e tendo-se não só em consideração que era feita referência através de um ã
importante rgo de comunicação social a um «crime» numa área da nossa competência, que çã
desconhecidos, como tambm termos presente que o Mo Po é o vigilante e defensor privilegiado dos 
«interesses difusos» - vid a este propósito a circular No 5/1989 da P.G.R., de 3/2/1989, - decidimos óçç
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efectuar algumas diligncias, em sede deste tipo de processo, tendo em vista um total esclarecimento de ãíê
todo o circunstancialismo mencionado no artigo do jornal em questão. óé
Tornmos, ento, declaraes ao seu autor, que nos afirmou ser licenciado em História e investigador í
desde h quatro anos do patrimnio histórico e cultural da localidade de Pereira e confirmando-nos a 
matria da notcia que assinou, apenas com o senão de desconhecer se a autarquia de Montemor-o-Velho 
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tinha licenciado tais obras. çõ
Por ofcio de 25/6/1991, o Senhor Presidente da Câmara Municipal desta vila esclareceu-nos que as ã
citadas obras foram embargadas em 21/12/1988, em Fevereiro de 1989 a Direcção-Geral de Transportes á
Terrestres remeteu  Cmara o seu parecer, em Março de 1989 a Câmara abordou este assunto, na á
sequncia de uma denncia, em Janeiro de 1991 deslocou-se a Pereira a equipa de arquitectos que 

trabalham para a Cmara, no dia 4/1/1991 foi solicitado ao Sr. Manuel Ribeiro Peralta que apresentasse o âí
projecto das obras, o que at agora no fez, e desmentindo-nos por último que a Câmara tivesse passado 
qualquer licena. ó
Para os devidos efeitos, foi-nos ainda remetido fotocpias dos documentos referenciados, que se 
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encontram juntos a fls. 4 e ss. dos autos. 
Finalmente, procedemos  inquirio do referido Manuel Ribeiro Peralta, que nos disse que não existe 
qualquer problema com a situao denunciada. 
Efectivamente, durante o ano de 1987 iniciou umas obras da restauro numa casa de rés-do-chão e 1o ê
andar, sita no largo da Praa, em Pereira, prxima da Casa do Celeiro. 

Acontece que essas obras foram embargadas pela Cmara em Dezembro de 1988, em virtude de não íáã
possuir o respectivo projecto. àçãç
A partir desta data, nunca mais as obras prosseguiram, tendo, entretanto, encarregado um engenheiro de ã
lhe fazer o projecto, que continua a aguardar. 
Declarou ainda que no era seu propsito abrir l um restaurante, mas sim fazer uma casa de habitação 
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para uma sua filha, no havendo tambm da sua parte inteno em colocar ali janelas de alumínio, embora 
confirme que existe na dita construo um porto e uma porta em alumnio. ç
Terminou, referindo que logo que o projecto esteja pronto submet-lo-  aprovaão da Câmara Municipal 
e respeitar o seu veredicto. 
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Foi esta a matria de facto que foi possvel carrear aos autos sobre este assunto. 
A problemtica em anlise tem a ver com a tutela dos «interesses difusos», ou seja, interesses que se 
reportam a bens por natureza indivisveis e insusceptveis de apropriao individual e deles sendo titular çã
uma pluralidade indefinida de sujeitos, potencialmente todos os cidados. (Sobre o conceito de interesses 
difusos, vid L. F. Colao Antunes, in A Tutela dos interesses difusos em Direito Administrativo: para uma ã

legitimao procedimental, Almedina, pg. 29 e ss.). 
Como exemplos destes direitos a doutrina tem referido os direitos ao ambiente e qualidade de vida, à 
fruio e criao cultural e dos consumidores, que no nosso ordenamento jurdico so objecto de 
consagrao no texto fundamental (cfr. artigo 66o, artigo 78o e artigo 60o da Constituio da República 
Portuguesa , respectivamente). 

Mas, pergunta-se, quem pode defend-los? 
Naturalmente, so os particulares, as associaes de defesa dos interesses em causa e o Mo Po. 
E enquanto o direito de aco popular previsto no artigo 52o da Constituio no se achar regulamentado e 
o nosso esprito associativo no despertar, caber inevitavelmente ao Mo Po um papel fundamental neste










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