Page 33 - Revista do Ministério Público Nº 79
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particular quando "o agente for cônjuge, ascendente, descendente, adoptante, adoptado, parente ou afim
até ao 2o grau da vítima, ou com ela viver em condições análogas às dos cônjuges", ou quando a coisa
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objecto de ilegítima apropriação for de valor diminuto ( ) e destinada à satisfação de uma necessidade
do agente ou de outra das pessoas acima indicadas" - cfr. artigo 207o do Código Penal ( 31 ).
Refira-se ainda que a restituição da coisa ilegitimamente apropriada, ou a reparação integral do prejuízo éó
causado, sem dano ilegítimo de terceiro, efectuada até ao início da audiência de julgamento em 1a âç
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instncia, conduz à atenuação especial da pena, nos termos do disposto no artigo 206o, No 1 do Código ãã
Penal, podendo a pena ser especialmente atenuada, se a restituição ou a reparação forem parciais (cfr. No çáçãà
2 deste preceito legal).
Nos termos do estatuído no No 2 do artigo 205o do Código Penal, é punida a tentativa do abuso de ç
confiana simples. íç
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Comparativamente ao regime do Código Penal de 1982, na sua redacção original, importa reter que, com a éç
reviso operada pelo Decreto-Lei No 48/1995, de 15 de Março, foi eliminada a punição especial do abuso óãã
de confiana relativamente a coisas pertencentes ao sector público ou cooperativo, constante do antigo íç
artigo 299o do Cdigo Penal, aplicável a este ilícito nos termos do No 3 do artigo 300o daquele diploma ã
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( ), sendo de realar também que, nas situações subsumíveis ao No 1 do actual artigo 205o do Código ãêç
Penal, se passou a admitir a punição em pena de multa, em alternativa à pena de prisão.
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III - O Crime de Infidelidade
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Quanto ao crime de infidelidade, estatui o artigo 224o do Código Penal que é punido com pena de prisão õ
at 3 anos ou com pena de multa "quem, tendo-lhe sido confiado, por lei ou por acto jurídico, o encargo de çê
dispor de interesse patrimoniais alheios ou de os administrar ou fiscalizar ( 33 ), causar a esses interesses, ãà
intencionalmente e com grave violação dos deveres que lhe incumbem, prejuízo patrimonial importante". â
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Como se refere no Ponto 34 do Prembulo do Decreto-Lei No 400/1982, de 23 de Setembro, "a infidelidade ãêá
- novo tipo legal de crime contra o património - ..., grosso modo, visa as situações em que não existe a ã
inteno de apropriao material, mas to só a intenção de provocar um grave prejuízo patrimonial. Além çõ
disso, ensina a criminologia e a poltica criminal que estes comportamentos não são tão raros como à
primeira vista se julga. De mais a mais, no mundo do tráfico jurídico, a regra de ouro é a confiança e a sua úççà
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violao pode, em casos bem determinados na lei, necessitar da força interventora do direito penal que, ã
apesar de tudo, tem de ser entendida como ltima ratio".
Verifica-se, assim, que na infidelidade administrativa está em causa a confiança, "a qual tanto pode resultar
da lei (caso do cabea de casal, tutor, administrador judicial, pais em relação aos filhos menores, etc.), çã
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como de acto jurdico, ou seja, "manifestao da vontade (humana) que, como tal, produz efeitos de ãõç
direito" ( 34 ).
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Como observa Lopes Rocha, "o crime visa punir a gesto desleal, e distingue-se do abuso de confiança à
porque nele o agente no actua com inteno de enriquecimento, nem de apropriação, antes, quando íá
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muito, com inteno de prejudicar. Abrange, por exemplo, o comportamento do administrador que
intencionalmente prejudica os interesses patrimoniais da pessoa cujos bens administra" ( 35 ) ( 36 ).
Registe-se, pois, como elemento primeiro de distino entre os crimes aqui em análise, que a infidelidade ã
se caracteriza pela ausncia da inteno de apropriao - tpica do crime de abuso de confiança - sendo a çã
conduta do agente animada da inteno de causar um prejuzo importante.
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Tal conduta, como realam Simas Santos e Leal Henriques, "tanto pode ser comissiva como omissiva (v.g.,
deixar de propor determinada aco ou interpor certo recurso" ( 37 ). çãá
Importar aqui fazer uma breve referncia s hesitaes verificadas no seio da Comissão Revisora em ã
ç
consagrar este novo ilcito criminal, assim tendo afirmado o Professor Eduardo Correia que "a razão õ
justificativa da no consagrao deste crime no Anteprojecto foi o perigo de, ante a eventualidade de uma
sano penal, as pessoas se furtarem a ocupar cargos de representao voluntária", adiantando, ainda,
que "a doutrina dominante e as legislaes na Frana, Espanha e Itlia entendem que é suficiente a
garantia ao prejudicado de direito indemnizao civil, enquanto as legislaes mais modernas da Suécia, çã
Noruega, Sua e Alemanha prevem j o crime de infidelidade" (
38 ).
Posteriormente, na sesso de 12 de Maio de 1966, a Comisso decidiu--se unanimemente pela
necessidade da previso do crime de infidelidade, optando-se, ento, pela consagração de uma
formulao genrica das situaes que podero conduzir aplicao deste novo crime que foi, logo então,
definido em termos muito semelhantes aos que, ainda hoje, esto consagrados no artigo 224o do actual
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Cdigo Penal ( ) ( ).
III. 1 - Actuao do agente; a questo do dolo
Quanto actuao do agente, adiantou desde logo o Professor Eduardo Correia que a mesma tem de ser
intencional, afastando-se o dolo eventual e o dolo necessrio ( 41 ) ( 42 ), desta forma se exigindo que o
agente represente um facto que preenche um tipo de crime, actuando com inteno de o realizar - artigo