Page 39 - REvista do Ministério Público Nº 81
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com essa inovação, mais parece que nos aproximamos, perigosa e erradamente, de um tipo de direito 
penal de autor, em que a razão de ser da incriminação aparece ligada à personalidade e modo de vida de 
um determinado agente, em vez de aparecer ligada à acção concreta. Porém, para obviar ao recurso de 
considerações de direito penal de autor, teremos que fazer uma interpretação restritiva dos tipos previstos 
íáí
no No 2 do artigo 164 e do artigo 163 do Código Penal na redacção da cit. Lei No 65/1998, no sentido de íó
tipos de perigo, isto é, em que o requisito da relação entre autor e vítima só pretende significar que aí 
existe maior perigo para a independência e liberdade da vítima. A propósito desta questão - direito penal óíãó
de facto e direito penal de autor - ver Roxin, Derecho Penal, tomo I, Civitas, Madrid, 1997, pág. 178 a 185. ãç
38 áãçá
( ) Enrique Orts Berenguer, Delitos contra la libertad sexual, Tirant lo blanch, Valencia, 1995, pág. 64.
( 39 ) O crime de violação não se basta com a cópula, coito anal ou coito oral, razão pela qual não podemos àê
classific-lo como crime de mão própria (se fosse um crime de mão própria - conceito importado da ç
doutrina alemã - seria impossível construir um caso de violação em autoria mediata). Como diz Teresa êêê
óêçáê
Beleza, Direito Penal, vol. 2, AAFDL, 1997, pág. 399, “a violação, pela sua descrição legal, não parece çãê
centrar a essncia do comportamento descrito no acto físico de ter cópula ou outro contacto sexual, mas ãóéç
na leso da liberdade de determinação sexual de quem sofre uma intimidade não querida, por violência íãààéêã
fsica ou equiparada (cf., no mesmo sentido, ac. STJ 18/10/1989, BMJ 390/142). Como diz Roxin, ob. cit., é
íóí
pg. 337, a violao  um crime de vários actos pois requer a prática de várias acções no facto (coacção e ããçí
realizao de cpula, coito anal ou coito oral).
ííã
( 40 ) Assim se entendia no domínio do Código Penal 1886 (cf. artigo 393), onde se fazia referência éç
expressa  violncia fsica. Ensinava Beleza dos Santos, RLJ, No 2271, pág. 370, que essa “violência úã

fsica” ou coaco fsica tinha de ser exercida directamente sobre a vítima, traduzindo-se na subjugação í
pela fora, obrigando a vtima a suportar a cópula que ela não queria consentir. Porém, com o Código âáê
Penal de 1982, abandonou-se a expressão “violência física”. Poderá, por isso, defender-se que o legislador í
preocupou-se mais com a importncia da “energia” que recai sobre a vítima, do que propriamente com a çí
sua origem.
é

( 41 ) Simas Santos, Cdigo Penal anotado, 2a edição, II vol., Rei dos Livros, Lisboa, 1996, anotação ao 
artigo 164. áãç
( 42 ) Pense-se no caso de a vtima ser uma criança de 5 anos. Ela nem terá capacidade de resistir e, no ã
entanto, poder, apesar disso, ser utilizada violência. A propósito do conceito de violência ver o ac. do 2o 

Juzo Criminal de Cascais proferido em 19/3/1996, CJ 1997, II, 285 ss.
( 43 ) Concorda-se com J. Figueiredo Dias quando, na Comissão Revisora (Actas, M. J., 1993, pág. 251), ê
alertou para o facto de no bastar a simples falta de consentimento, sendo preciso a violência ou a ameaça 
grave, por exp., para se verificar o crime de violação. Repare-se, também, que o legislador do Código á
á
Penal, desde a verso de 1982, eliminou a referncia “contra a vontade da mulher”, contida no artigo 393 íç
do Cdigo Penal 1886, certamente por entender que esse elemento era pressuposto da violência.
êãã
( 44 ) Jakobs, “Coacciones por medio de violencia (1986)”, in Estudios de Derecho Penal, UAM ediciones, 
Editorial Civitas, Madrid, 1997, pg. 439 a 459. Este Autor, ao referir-se ao comportamento que produz um ê
é
efeito coactivo paralelo ao da violncia (pg. 450), d o exp. de tirar a cadeira de rodas ou as muletas a um ê
paraltico.
áç
( 45 ) Uma conduta omissiva integradora do conceito de violncia (violência psíquica) será, por exp., o caso 
de no se fornecer alimentos enquanto no for feito o que se exige. á
áã
( 46 ) Ver, a propsito da desmaterializao do conceito de agressão como vis phisica (violência física), óê
Taipa de Carvalho, A legtima defesa, Coimbra Editora, 1995, pg. 223 e 224.
çí
( 47 ) A violncia  relevante quando se concluir que, na ausncia do acto de violência, a cópula, o coito 

anal ou o coito oral se no teria realizado. 
( 48 ) Alis, a doutrina tambm costuma distinguir, pelos efeitos psicolgicos provocados no sujeito passivo, 
dois tipos de violncia: a vis compulsiva (quando o coagido  capaz de tomar uma decisão segundo a sua 
prpria vontade, apesar dessa vontade ser pressionada) e a vis absoluta (quando o coagido não é capaz 

de opor resistncia  aco do sujeito activo).
( 49 ) Por exp.: o violador que agride o filho menor da vtima, na presena desta, enquanto ela não aceder a óóã
ter cpula ou coito anal com ele - trata-se aqui de violncia sobre terceira pessoa, que também funciona áã
como ameaa sobre a vtima. 

( 50 ) Por exp.: o violador que comea a partir o mobilirio da casa da vtima, dizendo ainda que faz explodir 
a casa pertencente  vtima, nica que esta tem, onde vive, que est a pagar e que ir pagar até ao fim da 
vida, fruto das economias de uma vida dura de trabalho, caso ela no aceda a ter cpula ou coito anal com 
ele - aqui a violncia sobre as coisas  acompanhada de ameaa grave.
í

( 51 ) No ac. RC de 12/1/1996, CJ 1996, I, 35, diz-se que “nos crimes sexuais, para que se verifique o ã
elemento violncia  suficiente que os actos sejam praticados contra ou sem a vontade da vtima...” Aí se 
entendeu como violncia, e como conduta integradora do crime do artigo 163 do Cdigo Penal, na versão ç
de 1995, a actuao de um indivduo que meteu a mo por baixo da T shirt que uma rapariga trazia ã

vestida, tendo-lhe apalpado os seios, contra a vontade dela. Diz-se nessa deciso que “a actuao do 
arguido encerra uma sujeio psquica, uma humilhao, sempre algo de surpresa, porque no houve 
consentimento da ofendida”. Parece, assim, que foi o movimento rpido e de surpresa levado a cabo pelo 
arguido que motivou o enquadramento dos factos no conceito de violncia. Todavia, no se pode deixar de










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